Violência inicial da Lava-Jato abriu precedente para violação de direitos, diz Fernando Fragoso

A ilegalidade e a violência iniciais da Operação Lava Jato abriram precedente para um novo modus operandi da Justiça, que passou a ignorar os requisitos necessários para a decretação de prisões e de conduções coercitivas no caso. Esta foi uma das análises que Fernando Fragoso, sócio do Fragoso Advogados, apresentou durante o seminário on-line “Seis anos da Operação Lava Jato: Reflexos no Processo Penal Brasileiro”, da Escola Superior de Advocacia – OAB/RJ, nesta quarta-feira (1). 

O debate teve a participação do ministro do Superior Tribunal de Justiça Nefi Cordeiro; da desembargadora federal do TRF da 2ª Região Simone Schreiber; do procurador Regional da República Leonardo Cardoso e do superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro, Tácio Muzzi. O coordenador de Processo Penal da ESA-OAB/RJ, Diogo Tebet, fez a moderação. A transmissão está disponível no YouTube.

Para Fernando Fragoso, a Operação Lava Jato começou, em 2014, “da forma mais ilegal e mais violenta que se pode imaginar”. Ele destacou momentos iniciais como a prisão do doleiro Alberto Youssef e a delação que levou à prisão do então diretor da Petrobras, Paulo Roberto Costa. “A prova contra essas pessoas era verbal, com poucos documentos”, afirmou. Entretanto esse modus operandis abriu precedente para que se ignorassem requisitos para posteriores decretações de prisão e conduções coercitivas para depoimento em repartições policiais. “O fundamento da prisão era simplesmente o da gravidade de acusação”, disse o ex-presidente do Instituto dos Advogados do Brasil (IAB).

O componente midiático da operação e a colaboração premiada foram outros pontos marcantes da Lava Jato, segundo Fragoso. “Tivemos, só no Paraná, 163 prisões temporárias e 130 prisões preventivas, de acordo com o Ministério Público Federal no Paraná. As diligências eram feitas às 6h da manhã, com equipes de televisão acompanhando. Por quê? Porque era indispensável à Lava Jato ter o apoio popular, conduzido pela mídia.” Tudo isso contribuiu para o aumento das delações, que se tornaram instrumento fundamental e exclusivo de produção probatória e das conduções coercitivas. 

‘Delação premiada é a última opção de um defensor’

Para Fernando Fragoso, a delação premiada “é a última opção de um defensor”. “Não sei existe opinião pior do que essa sobre advocacia: trabalhar com delação. Mas há tantas outras coisas que se pode fazer, eu me lembro do nosso colega Nélio Machado falando sobre isso. A advocacia é feita para defender, não é feita para colaborar. Mas há situações que o destino do próprio cliente [pode ser crítico] e o cliente prefere fazer um acordo.”

O ministro do Superior Tribunal de Justiça Nefi Cordeiro ponderou que o apoio popular à Lava Jato permitiu que o fenômeno jurídico passasse a ser amplamente discutido. “Começamos a ver essa realidade no período do mensalão. E percebe-se, cada vez mais, que a curiosidade se volta para a interpretação jurídica, especialmente dentro de casos criminais que é muito bom para mudanças que atendam a anseios sociais permanentes.” Mas Cordeiro ressaltou a preocupação com soluções de urgência baseadas em “aparentes anseios imediatos”. “‘Em um momento’, veremos a aprovação até mesmo à ditadura, da pena de morte, à abolição dos tributos. ‘Em um momento’ não significa que é necessidade para uma sociedade estável.” O ministro ressaltou, ainda, a necessidade da estabilização do Estado de Direito. 

A atenção midiática levanta, ainda, outra questão crucial, observou a desembargadora federal do TRF da 2ª Região Simone Shreiber. “As assessorias dos órgãos envolvidos na Lava Jato têm interesse em divulgar o trabalho que é feito e gera capital político o que também é importante, e ninguém duvida disso. Mas temos a questão da violência dos atos de exposição dos acusados e o aspecto do juiz, que pode acabar se rendendo a uma posição de populismo, o que gera um problema muito grande.” 

Casos criminais emblemáticos no Brasil, como o da família Nardoni, fizeram o procurador Regional da República Leonardo Cardoso destacar a importância do papel do advogado criminalista na proteção dos clientes. Cardoso lembrou que o Brasil figura entre os países com maior percepção popular sobre a corrupção e destacou o amadurecimento dos órgãos envolvidos na Lava Jato para reverter tal quadro. Segundo ele, isso contribuiu também para mecanismos de cooperação jurídica internacional, que vêm sendo mais bem elaborados, segundo o superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro, Tácio Muzzi. “Aprendemos com erros, mas também com muitos acertos”, disse.

‘Rever prisão em 2ª instância não quebra pilar da Lava-Jato’, diz Rodrigo Fragoso a ‘O Globo’

A coluna “Poder em Jogo”, na página 2 do jornal O Globo, publicou entrevista e foto de Rodrigo Falk Fragoso, sócio do Fragoso Advogados, nesta quinta-feira (22). À titular da coluna, Lydia Medeiros, Rodrigo falou sobre intervenção federal no Rio de Janeiro, judicialização da política e Operação Lava-Jato.

Questionado se eventual revisão da prisão após condenação em segunda instância pode “quebrar um pilar da Lava-Jato”, Rodrigo Fragoso disse que não. O Supremo Tribunal Federal tem dado sinais de que pretende rediscutir a questão.

“Os verdadeiros pilares da Lava-Jato são a eficaz cooperação jurídica internacional, o uso de softwares de processamento de dados e as delações premiadas. O que estimulou o início das delações foi a ameaça de prisão preventiva, não a de prisão em segunda instância. Tanto que a operação avançou antes mesmo da mudança do entendimento do STF, em fevereiro de 2016”, afirmou o sócio do Fragoso Advogados.

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De acordo com ele, “o momento atual é o da judicialização da política”. “Alguns juízes estão ocupando o espaço de poder aberto após o enfraquecimento das lideranças políticas. É perigoso, porque o juiz tem de ser independente para tomar decisões impopulares, nisto se distinguindo do político”, disse Rodrigo Fragoso.

Sobre a intervenção federal, o advogado afirmou que a inviolabilidade do domicílio é um dos direitos mais ameaçados.

“Em menos de 24h, já se falou em mandados de busca coletivos. Controlar áreas tidas como perigosas envolve sempre risco à dignidade dos moradores, que, vistos como suspeitos, costumam ser alvos de humilhações, revistas vexatórias e outras formas de violência gratuita. Nos presídios, a OAB precisará atuar com firmeza para preservar o sigilo das comunicações entre cliente e advogado”, disse Rodrigo.

O presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, Milton Fernandes, afirmou em entrevista à CBN, nesta quarta-feira (21), que “não haverá mandados de busca sem endereço”.

Veja abaixo a íntegra da entrevista de Rodrigo Fragoso:

OAB quer restringir abuso de conduções coercitivas

O jornalista Elio Gaspari criticou em sua coluna no Globo e na Folha de S.Paulo o abuso do uso das conduções coercitivas, citando como exemplo o suicídio do reitor da UFSC, Luis Carlos Cancellier.

“Ele não fora ouvido e não era acusado de ter desviado um só centavo (…). Luis Carlos Cancellier matou-se. Conduzido à Polícia Federal, lustrou o espetáculo, mas foi para casa. Qual a lógica de conduzir uma pessoa à delegacia, com a publicidade produzida pela autoridade coatora, em cima de um inquérito que corre em sigilo? (…) Houve intimação? Nem pensar. Se alguém acha que esse tipo de espetáculo doura a imagem dos policiais, procuradores e juízes que investigam ladroeiras, deve suspeitar que se dá o contrário: O resultado será absolutamente negativo”, escreveu Gaspari.

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Mas conduzir pessoas para prestar depoimento, sem que antes haja intimação, virou rotina no Brasil. De acordo com O Estado de S. Paulo, as conduções coercitivas cresceram 304% desde 2014. Elas foram legalizadas em 1941, mas passaram a ser usadas sistematicamente pela Operação Lava-Jato e ganharam repercussão com o caso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ano passado, em São Paulo. De acordo com a revista eletrônica ConJur, já houve mais de 200 conduções coercitivas na Lava-Jato.

A banalização preocupa a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil). O Conselho Federal da OAB pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF), na terça-feira (12), liminar para que a medida não seja aplicada se o investigado não tiver descumprido determinação judicial.

Para a desembargadora federal Simone Schreiber (TRF-2), “a condução coercitiva é uma violência que não pode ser corrigida por habeas corpus, dada sua instantaneidade. É um ato violentíssimo e ilegal, que só tem razão de ser por sua dimensão de espetáculo. Espetáculo de humilhação da pessoa investigada. Não serve para rigorosamente mais nada, só para a Polícia Federal fazer sua propaganda institucional, mostrando sua ‘eficiência no combate ao crime’”.

A OAB já havia questionado as conduções coercitivas imotivadas em março, quando ajuizou ação de descumprimento de preceito fundamental (ADPF). No entanto o STF não colocou o processo em julgamento no plenário. Agora, o pedido de liminar da OAB foi feito para análise monocrática do relator da ação, ministro Gilmar Mendes.

Os advogados defendem o cumprimento do artigo 260 do Código de Processo Penal. “A condução coercitiva só deve ser utilizada após prévia intimação, em tempo razoável, e diante da resistência do intimado. Tenho grande preocupação com o aspecto de trivialidade que têm assumido as conduções coercitivas em nosso Estado Democrático de Direito”, disse o presidente do Conselho Federal, Claudio Lamachia. Para ele, o uso indevido da medida configura “clara violação de prerrogativas, assumindo também o contorno de constrangimento pessoal e profissional.”

A OAB quer que seja proibido o uso de conduções coercitivas para “interrogatórios, oitivas ou tomada de declarações, ou, não sendo esse o entendimento, sucessivamente, para que sejam vedadas as conduções coercitivas utilizadas como medida cautelar autônoma, sem o prévio descumprimento de comparecimento após regular notificação”.

‘Tem sido prática ordinária e inquietante estorvar o exercício da advocacia’, diz Fernando Fragoso

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou, na terça-feira (5), o projeto de lei que criminaliza a violação de prerrogativas dos advogados (PL 8.347/2017). A proposta foi defendida pelo advogado Fernando Fragoso na 23ª Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, em 29 de novembro, em São Paulo.

“O exercício da representação do cidadão perante quaisquer organismos da administração pública, entre elas o Poder Judiciário, deve ser feito com ampla liberdade, como preconiza a Constituição Federal. Tem sido prática ordinária e inquietante estorvar o exercício da advocacia”, disse.

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Ressalvando ser ferrenho defensor do Direito Penal Mínimo, Fragoso afirmou que as violações às garantias do réu no processo vêm sendo reiteradamente cometidas, pelo impedimento de o acusado se consultar privadamente com o advogado e pela proibição de acesso aos processos, em fase de investigações administrativas, policiais ou no Ministério Público.

Fragoso destacou que o desprezo pelas garantias do réu tem crescido de forma assustadora. “Parece que só resta lançar mão da ameaça penal como medida eficaz para que certas autoridades cumpram a lei federal 8906 (Estatuto da Advocacia), dado o desprezo pelas garantias ali previstas.”

O projeto, que já havia sido aprovado pelo Senado em agosto, foi aprovado pela CCJ da Câmara por 45 votos a três. Agora, o texto segue para o plenário da Casa. A proposta fixa pena de um a quatro anos de prisão para quem ofender os seguintes direitos da classe:

• impedir o exercício da profissão;
• impedir o auxílio da OAB em caso de prisão;
• impedir o acesso de documentos judiciais;
• impedir a retirada dos autos de processos finalizados por até 10 dias, mesmo sem procuração;
• impedir de ter vista dos processos judiciais ou administrativos;
• impedir o profissional de auxiliar seus clientes durante investigação;
• ser preso, antes do trânsito em julgado, em local que não seja Sala de Estado Maior;
• afrontar a inviolabilidade do escritório ou o sigilo entre advogado e cliente.

A OAB será a responsável por pedir às autoridades investigação e diligências sobre eventual violação de prerrogativas.

Ouça a íntegra da palestra:

Fernando Fragoso faz palestra na Conferência Nacional da OAB

A criminalização da violação às prerrogativas foi tema da palestra do advogado Fernando Fragoso, nesta quarta-feira (29), na 23ª Conferência Nacional da Advocacia Brasileira, em São Paulo. Ele participou do painel “Defesa das Prerrogativas: um compromisso com a cidadania e o Estado Democrático de Direito”.

Fragoso falou sobre os fundamentos técnicos científicos do Projeto de Lei do Senado (PLS) 141/2015, aprovado pela Casa em agosto. Agora, a proposta está em tramitação na CCJ (Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania) da Câmara dos Deputados.

A Conferência Nacional reuniu ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e STJ (Superior Tribunal de Justiça) e advogados de todo o País, de segunda-feira (27) até esta quinta-feira (30), no Anhembi Centro de Eventos (Zona Norte de São Paulo).

No evento, os advogados refletiram sobre questões que envolvem a profissão, proporcionando o acompanhamento da evolução do Direito brasileiro e sua relação com temáticas que se destacam no cenário político-social do País.

Também participaram do painel, com Fernando Fragoso, os advogados Melissa Folmann, Cássio Scarpinella Bueno, Ricardo Pereira de Freitas Guimarães, Gustavo Badaró e Edward Rocha de Carvalho, e o desembargador Milton Nobre (Tribunal de Justiça do Pará). A coordenação foi feita pelos advogados Jarbas Vasconcelos (presidente da Comissão de Defesa das Prerrogativas e Valorização da Advocacia – CNDPVA), Charles Dias (procurador Nacional de Defesa das Prerrogativas) e Cássio Telles (vice-presidente da CNDPVA).