‘Receita deve provar informação falsa em declaração de repatriação’, diz Rodrigo Fragoso ao Valor Econômico

O advogado Rodrigo Falk Fragoso, sócio do Fragoso Advogados, afirmou ao jornal Valor Econômico que cabe à Receita Federal comprovar haver informação falsa em declarações de brasileiros que aderiram ao Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT) – o programa de Repatriação de recursos, em reportagem publicada nesta segunda-feira (21).

Contrariando o espírito da própria lei, a Receita Federal vem notificando contribuintes que participaram do programa e exigindo que comprovem a origem dos recursos. Na matéria “Receita notifica contribuintes que aderiram à repatriação, o Valor informa que “os contribuintes foram avisados ainda que as informações serão cruzadas com dados fornecidos por órgãos reguladores de outros países e que havendo inconsistência o caso será encaminhado ao Ministério Público Federal (MPF)”.

Como escrevera em recente artigo publicado também no Valor Econômico, “o posicionamento representa uma guinada no entendimento do Fisco. À época das adesões ao Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT), a própria Fazenda publicou um ‘Perguntas e Respostas’ esclarecendo dúvidas a respeito do programa, no qual indicava expressamente que cabia aos contribuintes apenas declarar que a origem dos bens era lícita. Segundo o tutorial, o ônus da prova de eventual falsidade da declaração era da Receita Federal (pergunta nº 40).”

Segundo Rodrigo Fragoso, se houver indícios e a Receita conseguir provar que a declaração contém informações falsas, o órgão obviamente poderá fazer a exclusão. “Mas é a Receita que deve provar”, enfatiza.

Repatriação sem armadilhas – Artigo de Rodrigo Falk Fragoso e Luiz Gustavo Bichara no Valor Econômico

Rodrigo Falk Fragoso e Luiz Gustavo Bichara

Mario Quintana já observava que “o passado não reconhece o seu lugar. Quer sempre estar presente”. A reflexão se aplica perfeitamente ao cotidiano dos contribuintes brasileiros.

A Receita Federal anunciou recentemente que poderá exigir a comprovação da origem dos recursos objeto da repatriação. O posicionamento representa uma guinada no entendimento do Fisco. À época das adesões ao Regime Especial de Regularização Cambial e Tributária (RERCT), a própria Fazenda publicou um “Perguntas e Respostas” esclarecendo dúvidas a respeito do programa, no qual indicava expressamente que cabia aos contribuintes apenas declarar que a origem dos bens era lícita. Segundo o tutorial, o ônus da prova de eventual falsidade da declaração era da Receita Federal (pergunta nº 40).

A mudança recente veio com a inclusão de duas notas ao “Perguntas e Respostas”, segundo as quais a desobrigação do contribuinte em comprovar a origem do recurso se referia apenas ao momento da adesão. Se, após esse instante, a Receita Federal questionasse a procedência dos bens regularizados, o contribuinte deveria apresentar comprovação da origem dos valores.

No momento de adesão, o cenário jurídico garantia a segurança de que a comprovação da origem dos recursos não seria cobrada

Esse anúncio preocupou o contribuinte que aderiu ao programa em 2016 e 2017 e que desde então acreditava, com razão, estar anistiado dos crimes indicados na Lei de Repatriação (Lei nº 13.254/2016) – já que a lei não exigia comprovação de origem para a adesão.

Lembre-se, ainda, de que a primeira versão do projeto que resultou na Lei nº 13.254/16 (PLS 298/2015) trazia disposição expressa para que os contribuintes se munissem de documentos suficientes para comprovar a origem dos recursos regularizados. No entanto, tal exigência foi retirada do projeto de lei aprovado, pois não fazia qualquer sentido lógico.

De fato, em grande parte das hipóteses dos aderentes ao RERCT, é impossível existir documentos ligando os recursos regularizados à operação que lhes deu origem. Tomemos como exemplo a clássica situação da venda de um imóvel nos idos dos anos 80, quando era normal (não é hora de hipocrisias) que o contribuinte recebesse parte formalmente e parte “por fora”. O que quer, agora, o Fisco? Foto da mala de dinheiro, confissão do comprador, delação do doleiro? Ora, é óbvio que não se tem prova de origem desses recursos. E não é por outra razão que não se tem notícia de exigência parecida nas inúmeras leis de repatriação editadas em inúmeros países, nem mesmo nas recomendações da OCDE sobre a estrutura dessas normas.

Portanto, no momento em que o contribuinte avaliava optar ou não pela adesão ao RERCT, o cenário jurídico garantia a segurança de que a comprovação da origem dos recursos não lhe seria cobrada. Inegável, pois, que essa exigência agora faz parecer que o contribuinte terá caído numa armadilha.

Também há notícias de intenções do novo governo de fazer um cruzamento de dados dos contribuintes que optaram pela repatriação (entre Coaf e Polícia Federal). A medida, se posta em prática, constituiria um ato investigatório de natureza criminal, expressamente proibido pela Lei de Repatriação. A lei concedeu anistia criminal ao contribuinte, estabelecendo que ele não poderá ser investigado só pelo fato de ter aderido ao programa.

Cruzar dados não é uma tarefa trivial à disposição das autoridades públicas. A recente lei de proteção aos dados pessoais incrementou a tutela dessas informações. Cruzar dados para fins investigatórios pressupõe violar o sigilo do contribuinte, o que só é permitido em situações excepcionais, mediante fundadas suspeitas de prática criminosa – o que não é o caso de quem aderiu ao programa.

Como dito, o RERCT estabeleceu que o contribuinte deveria apenas declarar que a origem dos recursos é lícita. Quem declarou, pagou o tributo e a multa é presumido contribuinte de boa-fé. Estando dentro do programa, está também protegido de investigações criminais.

Os 27 mil contribuintes que aderiram confiaram no Estado brasileiro e cumpriram sua parte no acordo, que resultou em R$ 174,5 bilhões regularizados e na vultosa arrecadação de R$ 52,6 bilhões em tributos e multas para o país. Romper o combinado neste momento, além de afrontar expressamente a lei, viola o seu espírito e semeia insegurança jurídica.

A investigação criminal também não poderá ser uma decorrência automática da exclusão do contribuinte do RERCT. A lei foi clara ao estabelecer que, mesmo na hipótese de exclusão, a investigação sobre a origem dos ativos somente poderá ocorrer “se houver evidências documentais não relacionadas à própria declaração do contribuinte”.

Ainda que se trate de pessoa alvo de delação premiada, o ônus da prova continua sendo da Receita. O Supremo Tribunal Federal já decidiu que delação não é prova nem indício. É apenas “meio” de obtenção de prova, que só tem validade se corroborada por provas. Cabe à Receita buscar provas. Se não as obtiver, deve arquivar o procedimento e manter o contribuinte no programa. Se delação não é prova nem indício, não é suficiente para obrigá-lo a demonstrar nada.

A investigação de crimes em razão da repatriação está condicionada à prévia exclusão do programa pela Receita Federal e, mesmo após tal exclusão, à existência de outras evidências documentais da irregularidade sobre a origem dos recursos que não sejam a própria declaração prestada pelo contribuinte. Assim, é razoável supor que a intenção da Receita venha a ser em breve reavaliada, para que não se rompa o pacto social de anistia.

Rodrigo Falk Fragoso é sócio do Fragoso Advogados e professor da Pós-Graduação em Direito da PUC-Rio. Luiz Gustavo Bichara é sócio do Bichara Advogados e procurador tributário do Conselho Federal da OAB.

REVISTA DE DIREITO PENAL Nº 02

PROGRESSO HUMANO E DIREITO PENAL
EDUARDO NOVOA MONREAL

Enfrentando o risco de pecar pela superficialidade, queremos abrir, nas breves linhas que seguem, uma janela que comunique o âmbito jurídico com o mundo exterior, a fim de que se renove o ar de muitos conceitos estanques e se ilumine a necessidade de reformar tantos conceitos penais que o progresso do mundo deixou para trás. …

RDP02

 

Recurso Criminal 5.085 (ata 89 de 1976)

  • Relator: Min. Djaci de Moinhos Pinheiro.
  • Recorrente: José Celso de la Roque.
  • Fato: Em entrevista à Revista Veja, José Celso afirmou que o ministro Rei Velloso, do Planejamento, “não tem caráter”.
  • Crime: art. 36 do Decreto Lei 898
“Art. 36. Ofender a honra ou a dignidade do Presidente ou do Vice-Presidente da República, dos Presidentes do Senado Federal, da Câmara dos Deputados, do Supremo Tribunal Federal, de Ministros de Estado, de Governadores de Estado ou Territórios e do Prefeito do Distrito Federal: Pena: reclusão, de 2 a 6 anos. Parágrafo Único. Se o crime for cometido por meio da imprensa, rádio ou televisão a pena é aumentada de metade, além da multa de 50 a 100 vêzes o valor do maior salário-mínimo vigente no país, se a responsabilidade couber a diretor ou responsável por tais órgãos da imprensa, escrita e falada”.
  • Recurso: Recurso contra a decisão que rejeitou exceção de incompetência da Justiça Militar.
  • Fundamentos: O Crime político exige ação com o propósito de atentar contra o Governo. Potencialidade lesiva à segurança nacional. Não tem perigo efetivo e concreto.
  • Sustentação: Heleno Fragoso

Recurso Criminal 5.014 (ata 27 de 1976)

  • Processo: Recurso interposto contra prisão preventiva.
  • Relator: Min. Alcides Carneiro.
  • Fato: Os reús tentaram reorganizar o partido comunista no Paraná.
  • Crime: art. 43 do Decreto Lei 898/69 (antiga Lei de Segurança Nacional)
 “Art. 43. Reorganizar ou tentar reorganizar de fato ou de direito, ainda que sob falso nome ou forma simulada, partido ou associação, dissolvidos por força de dissolução legal ou de decisão judicial, ou que exerça atividades prejudiciais ou perigosas à segurança nacional, ou fazê-lo funcionar, nas mesmas condições, quando legalmente suspenso: Pena: reclusão, de 2 a 5 anos”.
  • Fundamentos: Excesso de prazo. Nulidade do decreto de prisão. Ausência dos requisitos cautelares.
  • Não tem sustentação do Heleno. Somente falas do procurador e do juiz relator.